Uma Pessoa de Cada Vez: Carlos Marques

Carlos Marques é diretor da Escola Artística do Conservatório Calouste Gulbenkian, tendo o seu percurso académico passado por uma licenciatura em clarinete pela Universidade de Aveiro, um mestrado em psicologia da música e um doutoramento em psicologia pela  Universidade do Porto. Nos últimos meses, tem dedicado algum do seu tempo a coordenar o setor da Educação no Programa de Participação de Aveiro 2027, pelo que fomos ouvir a suas impressões sobre esta iniciativa.

Quais os principais desafios do seu sector, o da Educação? 
O maior desafio que a educação enfrenta atualmente é o modelo de ensino. A escola não tem conseguido acompanhar as mudanças na sociedade e tem pouca margem para inovar. A obesidade curricular é o principal entrave para que as mudanças possam acontecer. Naturalmente, e com a necessidade de tempo para cumprir esse curriculum obeso, outra das consequências é as crianças e jovens não terem a possibilidade de participar, criar ou até promover iniciativas fora dos muros da escola e do respetivo plano de estudos, deixando de ser criativos. São formatados para algo que, com certeza, não existirá no futuro.
A dificuldade em inovar está ainda relacionada com a falta de recursos, financeiros, materiais, humanos e físicos para um verdadeiro desenvolvimento tecnológico. Não é suficiente dotar as escolas com os computadores e esperar que estes “sobrevivam” por si só. Obviamente, a inovação não resulta apenas da tecnologia; no entanto, esta pode ser um fator potenciador de uma revolução na educação. Tornar a escola mais ágil é urgente. O envelhecimento do corpo docente, que se encontra desgastado e que é, na maioria dos casos, frágil digitalmente, acompanhada do descrédito a que a classe docente tem sido sujeita, pelos mais diversos agentes, levou a uma desmotivação generalizada da classe o que, consequentemente, tem reflexo na vida da escola e no desenvolvimento e crescimento da sociedade.

Quais as oportunidades que a Capital Europeia da Cultura 2027 pode trazer ao sector da Educação?
A educação, a saúde e a cultura são os pilares de qualquer civilização. Sem a escola, seja em que modalidade for, a sociedade é mais pobre. Os economistas, médicos, cientistas, e todos os outros, são-no porque passaram pela escola primeiro. Assim, a escola é, talvez, o principal fator de mudança em qualquer sociedade. Face ao exposto, foram identificadas algumas oportunidades de colaboração e que a candidatura a Capital Europeia da Cultura pode, e deve, potenciar. Por exemplo, demolir os diversos muros que existem na sociedade e aqui vou debruçar-me apenas sobre alguns da educação. Em primeiro lugar, promover a cultura que se faz na escola, nas mais diversas áreas artísticas e não só (cultura não é apenas arte) levando-a para fora de portas e valorizando-a como se de um artista de renome internacional se tratasse. Da mesma forma, levar a cultura e os valores para dentro da escola. As crianças de hoje serão os Homens do futuro. Quando mais rica essa sinergia for mais elevada será a qualidade desses Homens do futuro. Outra oportunidade que identificámos foi a de evolução em termos de comunicação aos mais diversos níveis. A estratégia de comunicação em Aveiro não tem funcionado. É urgente criar um modelo de comunicação, dos mais distintos aspetos (eventos, transportes, iniciativas, entre outros).

Como tem sido a experiência de acompanhamento do Programa de Participação de Aveiro 2027? 
A energia positiva e a constatação de que o grupo partilha das mesmas ideias e preocupações tem transformado este processo numa experiência muito positiva, interessante e desafiante. Assim, agradeço e felicito a todos os envolvidos neste programa participativo. Há, no entanto, como é natural nestas circunstâncias, algumas preocupações, sendo a principal a capacidade de transformar e enriquecer algumas das ideias e decisões que foram tomadas de forma prévia quando se decidiu avançar para a candidatura a Capital Europeia da Cultura. Que não sejaapenas um processo para mais tarde constar que os atores foram ouvidos, mas que, na verdade, pouca influência tenham tido nas tomadas de decisão.

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